Tuesday, November 13, 2012

Entrevista para a revista O FLU do Jornal O Fluminense!!

Por Natália Kleinsorgen:



Ela descobriu sua vocação ainda criança, já que seu pai era designer e o avô dono de fábrica de lingerie. Depois de passar uma temporada no exterior, a designer de moda Luana Ouverney, 26 anos, volta a Niterói com um novo desafio: produzir envolvendo sustentabilidade e lutar contra o fast fashion no Brasil. Sua nova grife de roupas, que em breve terá coleção masculina, ganhou o nome de Vitrô, uma junção das palavras vintage + trendy (da última moda) + retrofit


Qual é a linha que você buscou para a nova coleção da sua grife? 

Tudo o que eu faço é resultado do meu amor por brechós, preferência por peças vintage ao invés das em voga ditadas pela tendência, e vontade de criar moda com identidade. A Vitrô nasceu em 2008 e já viajou o mundo, passando a ser comercializada em multimarcas nos Estados Unidos e na Suíça, e para amigas da Colômbia à República Tcheca. Sigo o conceito de sustentabilidade e a novidade da coleção são as três linhas: retrofit, vintage e eco-line. A inspiração veio do mix de emoções que senti ao voltar a morar no Brasil. Escolhi como tema a dicotomia do nome do nosso País: “Brasil x Brazil”, em alguns momentos visto por estrangeiros como o país do futuro, de mulheres bonitas e paraíso tropical e, em outros, pelo ponto de vista de brasileiros, conscientes de todos os problemas sociais, políticos e da diversidade cultural.

Explique um pouco desses conceitos trabalhados nessa nova coleção.

A linha retrofit, conhecida no mercado da moda como upcycling, é feita a partir do reaproveitamento de tecidos de pontas de estoque e peças de roupa retrô, garimpadas em brechós mundo afora, desmontadas e refeitas com base em novas modelagens, acabamento e detalhe, tornando-se peças exclusivas. A vintage, como o próprio nome diz, é composta por preciosidades selecionadas a dedo, encontradas em lojas de segunda mão e tratadas para vestirem do jeito que foram encontradas. A eco-line é uma linha de camisetas unissex produzidas em malha de fibra de PET reciclado, com estampa em tinta à base d’água com arte desenvolvida pelos convidados Javier Pedrosa e Nayana Mendes, de Niterói, além de Rodrigo Rezende, de Nova Friburgo, e a Imarginal, de Recife.

Você já morou em vários lugares. De que forma estas experiências em outros países contribuíram para a sua vida profissional?

Eu passei três anos fora do Brasil, entre Estados Unidos, França e Suíça. Acredito que não exista exercício melhor de autoconhecimento. Você desmistifica preconceitos, aprende línguas, vê paisagens diferentes e descobre uma nova pessoa dentro de si mesmo. Nesses países, tive a oportunidade de fazer cursos relacionados à moda e com pessoas de diferentes culturas, além de aprender a criar estilo em vez de copiar tendência, e de trabalhar para empresas renomadas no mercado mundial de moda e figurino, como a gigante cadeia de lojas de departamento americana Macy’s, e depois a canadense Cirque du Soleil.

Como você chegou até esse caminho da moda sustentável?

Não há moda mais sustentável que a encontrada no sistema de brechós. Meu primeiro contato com a sustentabilidade foi em 2009, morando em São Francisco (EUA), cidade líder em desperdício zero na América do Norte. Além deles possuírem vários bazares de caridade, com roupas, calçados e acessórios em ótimo estado, a partir de US$1, é muito comum encontrar lojas de produtos de novos designers, que trabalhem com upcycling. E foi na Loft 1513, que comecei a comercializar as peças da Vitrô e a estudar sobre a possibilidade dessa produção no Brasil.

O que você considera que falta para que esse conceito funcione no brasil?

É necessário que haja a criação de políticas públicas, como um incentivo para a moda ecologicamente correta, como, por exemplo, a facilitação de empréstimos para os produtores de algodão orgânico. Se esses fornecedores quiserem solicitar um empréstimo em um banco para aumentar sua produção, o preço sairá mais alto, já que a produção é realizada sem agrotóxico e, portanto, não há garantias de colheita. Este é um dos motivos que influenciam o preço das roupas, geralmente mais caras que as normais. A própria cadeia de produção exige um investimento maior, devido à extração da matéria-prima, que é renovável, e também das condições de trabalho, que são baseadas em condições trabalhistas justas.

Qual a única forma de produzir de maneira sustentável aqui?

A sustentabilidade engloba quatro princípios: ecologicamente correto, economicamente viável, socialmente justo e culturamente diverso. Devido aos obstáculos, a opção encontrada é a de criar maneiras para que a produção não interfira no meio ambiente. Eu optei por utilizar o upcycling, o reaproveitamento de tecidos e pontas de estoque de peças de marcas bem conceituadas, e a utilização de malha feita a partir da fibra de PET reciclado, material que em vez de aumentar o volume dos lixões, cria emprego para cidadãos que separam embalagens, lavam e as levam para as fábricas especializadas na reciclagem.



Que outras pessoas você conhece que fazem um trabalho similar ao seu?

Que eu conheça, tem o niteroiense Flávio Lazarino, idealizador da marca Homem Árvore, que produz camisetas a partir de fibras naturais e resinas especiais, livres de PVC. Recentemente, ele abriu sua primeira loja em Copacabana, no Rio de Janeiro. Já a mineira Renata Drummond, da marca Ecow, também trabalha com reciclagem e reforma de roupas, dividindo-se entre Minas Gerais e São Paulo.

Gostaria que você explicasse um pouco mais sobre a “slow fashion” e sobre como isso pode ser benéfico para a sociedade.

O slow fashion (moda devagar), em contrapartida ao fast fashion (moda rápida), foi  desenvolvido com o objetivo de conscientizar os criadores de moda sobre o tempo que a natureza leva para repor os recursos naturais usados na produção têxtil, em comparação à velocidade com que os produtos são consumidos e descartados. A ideia é que, assim como os compradores mais conscientes sintam prazer em consumir um produto ético, que os estilistas também passem a ter prazer em criar, desenvolver e produzir algo que eles sabem que não agredirá produtores e o meio ambiente, valor perdido tanto na criação quanto no consumo.

Quais os próximos passos profissionais que você pretende dar para alavancar ainda mais a sua carreira?

O retorno ao Brasil foi estudado junto à reformulação da Vitrô. O objetivo da nova coleção e de futuras linhas é o de arrecadar dinheiro suficiente para eu realizar o sonho de fazer meu mestrado em Sustentabilidade em Moda, no Instituto Esmod, de Berlim, no final do ano que vem. Pretendo continuar fazendo o que eu amo: produção de moda e figurino, divulgando a Vitrô pelo Brasil e pelo mundo, vestindo pessoas por meio de uma moda que as diferencie, as identifique e as tornem únicas, incorporando ética e estética, conforto e estilo, vanguarda e atitude ao nosso conceito de moda.

O Fluminense